Pular para o conteúdo principal

Cientologia Política

Nota 1

"Um espectro ronda o capitalismo: o espectro do antifetichismo”, postou Robert Kurz em sua conta no Facebook, umas 19h30, terça-feira, diazinho ordinário não fosse a reprise de Vamp. Inicialmente, somente três pessoas curtiram o obtuso fraseado. Duas tascaram emoticons que assentiam claramente à teorética neoapocalíptica. Apenas uma teve a curiosidade de perguntar se se tratava do capital enquanto estrutura organizacional física (superestrutura) ou do capital enquanto ente figurativo e influxo nos imaginários coletivos (infraestrutura). Deu-se momentânea conturbação de caracteres, que terminou em declarada cizânia. Diante do impasse, Robert Kurz, ex-taxista alemão, torcedor do Bayer Leverkusen e ideólogo da crítica radical, optou por oxigenar as relações. Nas próximas horas, publicou fotos da visita ao irmão na região da Bavária e réplicas de cartões postais enviados pelo neto, Alexandr Ptoir Schulz, 29 anos. Schulz esteve na América do Sul no período das férias. Na oportunidade, visitou Fortaleza, comeu caranguejo e serviu-se de dois banheiros de restaurantes e um terceiro, este localizado no hall do hotel onde se hospedava.

Nota 2

"O mundo pós-Rosa da Fonsêca já é realidade”, berrou, em aparte desnecessariamente longo, o militante polaco-cearense Angus Czinasi, 27 anos. Feito tiro de borracha disparado pelo Bope, a constatação logo atingiu os participantes do IV Seminário Internacional das Teorias Críticas Radicais, realizado no Kukukaya, no último final de semana de julho. O evento teve por finalidade debater a conjuntura atual, a nova temporada de Game of Thrones e a tradução para o português de um livro de receitas esotéricas que Marx teria deixado aos cuidados de uma camareira judia em Londres. Encharcada de elementos “dequedentistas” (neoapocalípticos), a análise se seguiu à exposição Quem mexeu no meu Capital?, que, em resumo, pretendia reunir as melhores teorias salvacionistas em voga neste início de século. Nota do colunista: de modo geral, o conjunto de regras que dão liga às críticas radicais fundamenta-se no que se chama popularmente de Judgment Day, ou Dia do Juízo Final, que nada mais é do que o dia em que as trombetas dos anjos da morte soarão para todos e todas, sem exclusão de classe, cor ou credo.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Projeto de vida

Desejo para 2025 desengajar e desertar, ser desistência, inativo e off, estar mais fora que dentro, mais out que in, mais exo que endo. Desenturmar-se da turma e desgostar-se do gosto, refluir no contrafluxo da rede e encapsular para não ceder ao colapso, ao menos não agora, não amanhã, não tão rápido. Penso com carinho na ideia de ter mais tempo para pensar na atrofia fabular e no déficit de imaginação. No vazio de futuro que a palavra “futuro” transmite sempre que justaposta a outra, a pretexto de ensejar alguma esperança no horizonte imediato. Tempo inclusive para não ter tempo, para não possuir nem reter, não domesticar nem apropriar, para devolver e para cansar, sobretudo para cansar. Tempo para o esgotamento que é esgotar-se sem que todas as alternativas estejam postas nem os caminhos apresentados por inteiro. Tempo para recusar toda vez que ouvir “empreender” como sinônimo de estilo de vida, e estilo de vida como sinônimo de qualquer coisa que se pareça com o modo particular c...

Cidade 2000

Outro dia, por razão que não vem ao caso, me vi na obrigação de ir até a Cidade 2000, um bairro estranho de Fortaleza, estranho e comum, como se por baixo de sua pele houvesse qualquer coisa de insuspeita sem ser, nas fachadas de seus negócios e bares uma cifra ilegível, um segredo bem guardado como esses que minha avó mantinha em seu baú dentro do quarto. Mas qual? Eu não sabia, e talvez continue sem saber mesmo depois de revirar suas ruas e explorar seus becos atrás de uma tecla para o meu computador, uma parte faltante sem a qual eu não poderia trabalhar nem dar conta das tarefas na quais me vi enredado neste final de ano. Depois conto essa história típica de Natal que me levou ao miolo de um bairro que, tal como a Praia do Futuro, enuncia desde o nome uma vocação que nunca se realiza plenamente. Esse bairro que é também um aceno a um horizonte aspiracional no qual se projeta uma noção de bem-estar e desenvolvimento por vir que é típica da capital cearense, como se estivessem oferec...

Atacarejo

Gosto de como soa atacarejo, de seu poder de instaurar desde o princípio um universo semântico/sintático próprio apenas a partir da ideia fusional que é aglutinar atacado e varejo, ou seja, macro e micro, universal e local, natureza e cultura e toda essa família de dualismos que atormentam o mundo ocidental desde Platão. Nada disso resiste ao atacarejo e sua capacidade de síntese, sua captura do “zeitgeist” não apenas cearense, mas global, numa amostra viva de que pintar sua aldeia é cantar o mundo – ou seria o contrário? Já não sei, perdido que fico diante do sem número de perspectivas e da enormidade contida na ressonância da palavra, que sempre me atraiu desde que a ouvi pela primeira vez, encantado como pirilampo perto da luz, dardejado por flechas de amor – para Barthes a amorosidade é também uma gramática, com suas regras e termos, suas orações subordinadas ou coordenadas, seus termos integrantes ou acessórios e por aí vai. Mas é quase certo que Barthes não conhecesse atacarejo,...