Com ar pesaroso, o garçom aponta a
televisão e diz que a outra também foi mutilada, e por mutilada quer dizer que alguém ia
passando na rua e resolveu apedrejar os dois aparelhos, aparentemente sem razão
para tal, de maneira que agora o homem de cabelo cortado bem rente ao couro me
encara como se buscasse investigar na minha incipiente reação facial o quão fundo
aquela informação parecia ter batido, e qual não é a sua surpresa quando sorrio
e digo sem medo de ser feliz “as pessoas ficam realmente possuídas na festa de
Momo”, antecipando-me, portanto, à tentativa do garçom de talvez não procurar
culpados, mas de checar as consequências da narrativa que acabara de contar, e
foi nessa hora que, preferindo encurtar a conversa a continuar naquele jogo
de gato e rato, pedi um prato executivo de filé à parmegiana, que é o que
sempre peço naquele restaurante.
Numa dessas andanças pelo shopping, o anúncio saltou da fachada da loja: “museu da selfie”. As palavras destacadas nessa luminescência característica das redes, os tipos simulando uma caligrafia declinada, quase pessoal e amorosa, resultado da combinação do familiar e do estranho, um híbrido de carta e mensagem eletrônica. “Museu da selfie”, repeti mentalmente enquanto considerava pagar 20 reais por um saco de pipoca do qual já havia desistido, mas cuja imagem retornava sempre em ondas de apelo olfativo e sonoro, a repetição do gesto como parte indissociável da experiência de estar numa sala de cinema. Um museu, por natureza, alimenta-se de matéria narrativa, ou seja, trata-se de espaço instaurado a fim de que se remonte o fio da história, estabelecendo-se entre suas peças algum nexo, seja ele causal ou não. É, por assim dizer, um ato de significação que se estende a tudo que ele contém. Daí que se fale de um museu da seca, um museu do amanhã, um museu do mar, um museu da língua e por