De onde veio o cearense? Essa é uma pergunta a qual muitos pesquisadores tentam responder há décadas, sem sucesso, numa encruzilhada epistêmico-genealógica que vem desafiando gerações de intelectuais e inteligências, de Gilmar de Carvalho a Falcão.
De olho no boom das séries televisivas e no conceito de “streamingzação” da vida, no entanto, alguns estudiosos mais arrojados passaram a apostar no potencial cinematográfico e comercial de nossas indisfarçáveis raízes nórdicas, fixando nossa cearensidade no mesmo CEP de Thor e de outras celebridades do mundo mitológico, para motivo de orgulho.Por essa via de estudos, ainda no século XVI, esses proto-cearenses desembarcaram no território onde fundariam a província do Siará Grande calçando Crocs e usando “smartwatch”, a tez alva um tanto avermelhada ante a explosão de raios UVA e UVB que eles tentavam disfarçar apelando a bloqueadores com fator 80. Era o preço pela custosa aclimatação.
Como se tratava de uma terra rústica, despida ainda de um único Coco Bambu e sem tanto refinamento como aquelas com as quais estavam habituados, puseram-se a bordo de patinetes elétricos e SUVs brancas a vencer morros e lagunas, de maneira a explorar a região com maior facilidade.
Assim percorreram as muitas léguas que distam de uma ponta a outra e que, segundo lendas de habitantes locais cuja carga genética é uma nota de rodapé no nosso DNA, como negros e índios, era atravessada por uma silvícola num intervalo de poucas horas.
Obviamente era uma mentira que não renderia um episódio de série na Netflix, logo disseram esses adoradores de Odin, aqueles a quem devemos nossa estatura média na faixa de 1,90 metro e as íris comumente azuis ou verdes, além do pescoço delgado e oblongo, um traço fácil de identificar hoje em dia em qualquer morador do Carlito Pamplona, da Aldeota ou do Joaquim Távora, a exemplo do autor destas mal traçadas.
De cara, esses primeiros cearenses, sem o saberem, estabelecem-se no Forte de Schoonenborch, para onde fazem vir uma filial do Outback e um drive-in recém-fundado ao qual deram o nome de Colossus, em homenagem às deidades que o povo trazia, além do sangue azul pelo qual somos agradecidos até hoje.
Em seguida, como já era costume, estenderam quilômetros e mais quilômetros de cercadinhos por vastas áreas da terra, criando, de um lado, um setor VIP para o qual nem todo ameríndio tinha acesso, apenas se tivesse a pulseirinha confeccionada por habilidosas costureiras; e, do outro, um amplo estacionamento com vista para o morro de onde se via, nas tardes mais quentes, os verdes mares bravios.
E foi assim que, entre brindes de espumante, coquetéis com bombinhas de camarão e ar-condicionado no 15º C, fez-se a colonização do Ceará, tudo de maneira civilizada, sem lugar para violência e opressão das gentes que aqui já viviam desde há muito e com o elevador de serviço reservado àqueles que, ontem como hoje, se dedicam à mobilidade social.
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