Domingo é uma fresta, uma dessas que se formam na janela do
quarto quando a gente se senta e o dia parece escorrer. A vida escorrendo sem ordem ou
controle. É assim que vejo tudo, um fluxo de coisas que tento parar com
as mãos, mas, bom, talvez não seja o caso de interromper nada agora. Ou talvez
eu apenas não tenha força mesmo. Talvez já esteja tudo parado e o movimento é
só ilusório.
Fato é que gosto de domingos. Uns clichês ambulantes. O de
hoje, por exemplo, nublado e melancólico como um desses domingos colhidos
diretamente no dicionário. Se fôssemos à procura do que quer dizer o dia ao pé
da letra, encontraríamos a definição vivendo hoje. E olhar essas fotos de rodas
de samba pela cidade apenas confirma a natureza triste do domingo. Um dia de
contrastes.
O lado bom é que, quando damos por ele, acabou. Feito o
amor, e lá vou eu me meter a falar disso novamente. Quando acaba? A gente não
sabe.
Eu lembro que, em algum momento da vida, houve um sábado. Não
sei como o restante das pessoas lida com a absoluta quebra de expectativas e o
abismo colossal de projeções que separam esses dois dias. É como uma dessas
dualidades fundadoras de tudo, morte/vida, sexo/amor e por aí vai. Assim é com
o sábado/domingo.
Ontem eu estava bêbado numa festa dançando com todo mundo
que fingisse dançar tão bem quanto eu. Depois houve uma briga, e aí não lembro
de mais nada, exceto que choveu e eu pensei que seria bom descer do carro no
meio da Ildefonso Albano e tomar banho de chuva às 3 da manhã e quem sabe andar
um pouco pela rua, fumar sob uma marquise e esperar amanhecer. Quem espera
amanhecer ainda não entregou os pontos, é o que dizem.
Mas não fiz nada disso,
como sempre. Brinquei com os pensamentos como um gato com uma bola de papel. Inconsequentemente.
Não tinha nada de importante a fazer. A noite tinha sido uma sequência mais ou
menos harmônica: uma dança, uma briga, mais cigarros e chuva, tudo filtrado por
uma lente manchada por cinco ou seis cervejas.
Até que veio do
domingo. Eu sabia que seria nublado porque li no jornal no dia anterior que o dia
seria assim, mas jamais imaginei que o futuro trataria de confirmar o que uma
notícia de jornal havia informado no dia anterior. Eu pensei até na bicicleta,
que é uma maneira de desafiar o tempo e os dias, correr contra tudo que é
determinado e certo e assumir o risco como uma profissão de fé. Nunca respeitar
o limite da praia.
Eu sempre quis o risco de um salto. E agora estou aqui,
escrevendo sobre o domingo, um ponto de parada na correria. Pausa.
Eu pensei que iria além da risca do mar. Acho que já contei
essa história. A risca do mar é um meridiano imaginário além do qual a água do
mar se encrespa e tudo fica mais turbulento. Quando me disseram que existia, dei risada. Um
pescador não teme essa linha, pensei, um bom pescador conduz sua embarcação de
forma corajosa além de qualquer risca do mar, enfrenta as ondulações e os
fortes ventos.
Talvez eu não seja um bom pescador.
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