Congresso de irônicos e diplomáticos elege novo presidente, que, por timidez, mas também por medo, decidiu que talvez fosse melhor ficar de fora do enquadramento do fotógrafo
Se a política é a guerra por outros meios, a
“diplomacia cultural” é a continuidade da ironia em âmbito diferente; ambas
inviabilizam o debate, anulam a troca de ideias, aniquilam a divergência. A ironia aposta na superabundância do ruído; a diplomacia, na superabundância do
silêncio.
Uma diverge na arena pública para convergir
na privada; a outra converge publicamente para divergir depois, nem sempre pessoalmente,
o que a torna, ao menos nesse aspecto, mais nociva que a ironia.
Fato é que ambas não estão verdadeiramente
interessadas na troca, mas na viabilização de projetos personalistas.
Mas há entre os dois procedimentos – o
irônico e o diplomático – diferenças claras. Enquanto a ironia recorre ao humor,
acusando a superdimensão do ego, a diplomacia despe-se, em aparência, de
qualquer vaidade – e, nesse caso, esconder o ego revela-se prova de vaidade
ainda maior. Exibindo-a, a ironia inflaciona a vaidade; a diplomacia, escondendo-a.
A ambição máxima da ironia é a
discordância, não importa contra o quê ou contra quem; a da diplomacia, a
concordância, não interessa com quem ou a favor do quê. Fato é que as duas se
refestelam nos extremos: a condenação radical e mal-humorada de um lado e a
anuência bovina do outro.
O curioso é que ironia e diplomacia, embora
dividam o mesmo lugar no sofazinho, atacam-se mutuamente. A ironia atribui à
diplomacia a responsabilidade pelo ambiente estéril onde nada de importante
vinga; a diplomacia devolve a acusação. A ironia enxerga na diplomacia um
câncer das relações sociais; para a diplomacia, a ironia é um parasita com
megafone.
Se o objetivo da ironia é escamotear o que
de fato é intenção, é verdade, é a natureza da mensagem, o da diplomacia é revelar
para esconder, aproximar-se para se afastar, fingir-se parte para depois se desanexar.
Distanciando-se, a ironia cria falsas
proximidades. Na diplomacia ocorre fenômeno inverso: aproximando-se, cria falsas
distâncias. Ironia e diplomacia são os lados da mesma moeda.
A ironia é quase sempre uma guerra pessoal,
particular, clara; dispõe de armas peculiares; é dirigida a um público cujo rosto
pode ser adivinhado em cada gracejo, cada piada, cada desvio da norma, cada
pequeno manifesto publicado nas redes sociais; não é, portanto, concessiva; demonstra
sempre a quem se endereça, ainda que nas entrelinhas, camuflado ou despistado. É
representada geometricamente por uma reta.
A diplomacia é opaca, difusa, multimeios; maleável,
versátil, arma-se com o que estiver ao alcance; frequentemente aponta para uma
audiência também amorfa, dispersa, descentralizada; tem a ambição suprema de estar
em concordância; elege pessoas afins, não ideias afins, com as quais passa a
desenvolver relação simbiótica. É representada geometricamente por um círculo.
Numa cidade cuja planta é inspirada no disciplinado
xadrez de uma Paris inalcançável, as duas figuras, reta e círculo, jamais se
encontram – e quando, por inevitável, o encontro acontece, a ironia e a diplomacia trocam tapinhas nas costas.