
*Ensaio publicado no suplemento acadêmico de uma revista futurista.
UM PARÊNTESE CONTEXTUAL: é amplamente sabido que, a esse propósito, estão em consonância não apenas economistas, sociólogos e “jornalistas de várzea”, mas também responsáveis pelo setor de crediário das grandes redes varejistas e gerentes de firmas de crédito fácil. Com mínimas variações no teor analítico de suas falas, a classe C pontifica como ápice fulgurante de uma cadeia cujos elos tornam-se mais frágeis à medida que a ciranda da macroeconomia degringola neste início de século (vide quebradeira na zona do euro, vista como sem volta por estudantes do segundo semestre do curso de economia doméstica da UFC).
À PARTE CERTO PESSIMISMO de medalhões como Alexandre Garcia e Miriam Leitão, sempre pesarosos no esforçado exercício de antecipação de um futuro apocalíptico, essa fatia mais densa do espectro de consumo brasileiro constitui-se como um farol de Alexandria no claudicante arranjo financeiro global.
“É indiscutível a importância da classe C na fatura do cartão do mundo ocidental, no fornecimento de modelos de negócios e, principalmente, na revalorização dos programas de auditório, estabelecendo tensão semiótica ao aproximar-se dos valores da alta cultura”, teoriza, com tácita segurança e domínio morfossintático, @Airtondefarias, ainda que seu campo de estudo “passe ao largo da antropologia da classe C”.
UM SITE OBSCURO na internet define assim a nova classe: a classe "C" atualmente representa 90% da população brasileira, é responsável por 79% do consumo, atinge 69% do mercado de cartões de créditos, são 86% do total de internautas no Brasil e movimentam mais de 760 bilhões por ano.
SETECENTOS E SESSENTA BILHÕES de reais, dólares ou yuans? Não interessa. O fato é que, no contexto exato da “primavera do crédito” (ASSURBANIPAL, 1982), o sapatênis, artefato que instaura irreparável fratura estética e funcional na indústria calçadista, é metonímica e surpreendentemente interpretado como chave-mestra no processo de valoração e de investigação do ethos inerente à classe C, a saber: suas paixões, seus vícios, suas virtudes.
Metonímica porque, encarada de frente, sem preconceito, a modalidade de calçado, misto de sapato e tênis, daí o nome, destaca-se por sua versatilidade: vai bem com jeans, bermuda ou calça risca de giz, havendo mesmo quem se arrisque a exibir um belo exemplar da Democrata ou da West Coast trajando um sempiterno moleton Adidas.
DE ACORDO COM CHRIS VIEIRA, personal stylist de Neymar, Joelma e Datena, a combinação do sapatênis com qualquer muda de roupa que nos caia à mão “é sumamente estilosa, perfeita para quem vai à compra do galeto dominical na Gomes de Matos, ao cinema no dia de promoção do Multiplex ou até à inauguração das Casas Bahia motivado pela promoção da Rihomo”.
Francis Santiago
PESQUISAS ASPIRACIONAIS da Universidade de Stanford (campus de Sobral) revelam que, assim como camisas de gola polo com brasão de times de rúgbi denotam, da parte de quem as desfila, concentrado poder aquisitivo e pujança social nível 3 (elaborada pelo MEC, a tabela vai até 5), o sapatênis apresenta-se como artigo representativo de um conjunto heterogêneo e ainda pouco conhecido de valores comumente associados à nova classe ascendente, qual seja, à classe C (até 10 salários mínimos, TV LCD em 12 prestações e cartões C&A, Riachuelo e Insinuante dividindo a mesma carteira Aeropostale fake).
PESQUISAS ASPIRACIONAIS da Universidade de Stanford (campus de Sobral) revelam que, assim como camisas de gola polo com brasão de times de rúgbi denotam, da parte de quem as desfila, concentrado poder aquisitivo e pujança social nível 3 (elaborada pelo MEC, a tabela vai até 5), o sapatênis apresenta-se como artigo representativo de um conjunto heterogêneo e ainda pouco conhecido de valores comumente associados à nova classe ascendente, qual seja, à classe C (até 10 salários mínimos, TV LCD em 12 prestações e cartões C&A, Riachuelo e Insinuante dividindo a mesma carteira Aeropostale fake).
UM PARÊNTESE CONTEXTUAL: é amplamente sabido que, a esse propósito, estão em consonância não apenas economistas, sociólogos e “jornalistas de várzea”, mas também responsáveis pelo setor de crediário das grandes redes varejistas e gerentes de firmas de crédito fácil. Com mínimas variações no teor analítico de suas falas, a classe C pontifica como ápice fulgurante de uma cadeia cujos elos tornam-se mais frágeis à medida que a ciranda da macroeconomia degringola neste início de século (vide quebradeira na zona do euro, vista como sem volta por estudantes do segundo semestre do curso de economia doméstica da UFC).
À PARTE CERTO PESSIMISMO de medalhões como Alexandre Garcia e Miriam Leitão, sempre pesarosos no esforçado exercício de antecipação de um futuro apocalíptico, essa fatia mais densa do espectro de consumo brasileiro constitui-se como um farol de Alexandria no claudicante arranjo financeiro global.
“É indiscutível a importância da classe C na fatura do cartão do mundo ocidental, no fornecimento de modelos de negócios e, principalmente, na revalorização dos programas de auditório, estabelecendo tensão semiótica ao aproximar-se dos valores da alta cultura”, teoriza, com tácita segurança e domínio morfossintático, @Airtondefarias, ainda que seu campo de estudo “passe ao largo da antropologia da classe C”.
UM SITE OBSCURO na internet define assim a nova classe: a classe "C" atualmente representa 90% da população brasileira, é responsável por 79% do consumo, atinge 69% do mercado de cartões de créditos, são 86% do total de internautas no Brasil e movimentam mais de 760 bilhões por ano.
SETECENTOS E SESSENTA BILHÕES de reais, dólares ou yuans? Não interessa. O fato é que, no contexto exato da “primavera do crédito” (ASSURBANIPAL, 1982), o sapatênis, artefato que instaura irreparável fratura estética e funcional na indústria calçadista, é metonímica e surpreendentemente interpretado como chave-mestra no processo de valoração e de investigação do ethos inerente à classe C, a saber: suas paixões, seus vícios, suas virtudes.
Metonímica porque, encarada de frente, sem preconceito, a modalidade de calçado, misto de sapato e tênis, daí o nome, destaca-se por sua versatilidade: vai bem com jeans, bermuda ou calça risca de giz, havendo mesmo quem se arrisque a exibir um belo exemplar da Democrata ou da West Coast trajando um sempiterno moleton Adidas.
DE ACORDO COM CHRIS VIEIRA, personal stylist de Neymar, Joelma e Datena, a combinação do sapatênis com qualquer muda de roupa que nos caia à mão “é sumamente estilosa, perfeita para quem vai à compra do galeto dominical na Gomes de Matos, ao cinema no dia de promoção do Multiplex ou até à inauguração das Casas Bahia motivado pela promoção da Rihomo”.
Segundo o antropólogo Sávio Bocanera, a excêntrica junção de moda íntima com alta tecnologia não pode ser confundida com mera expressão de traço esquizóide dessa classe tão numerosa. Afinal, conforme pesquisa, a classe C é maioria, lotando aeroportos e seções de troca das lojas de departamento.
Para o cientista, cuja dissertação espolia o sapatênis de sua áurea meramente funcional, o tipo de calçado é resultado, consciente ou não, de “uma densa imbricação de anseios, valores e desejos, locus de pertencimento povoado por narrativas lineares estreladas por atores globais em fitas piratas com temática espírita”.
SEM MENCIONAR, MAS JÁ MENCIONANDO o apuro visual e transdisciplinar das elaborações de Bocanera, o que fica de fato é o lugar de cruzamento e de potência do sapatênis na configuração social, econômica, espiritual e de entretenimento da classe C, sobre o qual nos debruçaremos com mais vagar logo depois do sabático Zorra Total.
SEM MENCIONAR, MAS JÁ MENCIONANDO o apuro visual e transdisciplinar das elaborações de Bocanera, o que fica de fato é o lugar de cruzamento e de potência do sapatênis na configuração social, econômica, espiritual e de entretenimento da classe C, sobre o qual nos debruçaremos com mais vagar logo depois do sabático Zorra Total.