O ETERNO VÔO DE POE
O ANO DE 2009 CONDENSA MORTE E VIDA PARA O ESCRITOR EDGAR ALLAN POE. NO ÚLTIMO DIA 19, FORAM CELEBRADOS 200 ANOS DE NASCIMENTO DO AUTOR DE O CORVO. TAMBÉM EM 2009, É LEMBRADO O DIA EM QUE POE FOI ENCONTRADO MORTO NUMA RUAZINHA DE BALTIMORE, NOS ESTADOS UNIDOS. NESTE DOMINGO, O VIDA E ARTE CULTURA CONSTATA: 160 ANOS DEPOIS, POE PERMANECE VIVO
HENRIQUE ARAÚJO>>>ESPECIAL PARA O POVO
Metade corvo, metade Edgar A. Poe, uma ave de penas lustrosas alçou vôo no começo do século XIX. Duzentos anos depois, o bater das asas do animal ainda faz estremecer. Ouvindo-o, leitores no mundo inteiro sentem calafrios, pequenos sustos ou arrepios que podem se estender por horas ou dias. Impressionam-se com a narrativa do sobrenatural, do extra-humano, a mesma que suspende o raciocínio por meio do terror e provoca reflexões usando o grotesco como passaporte. O inumano: eis a argamassa edificante da literatura de Poe.
Bêbado, viciado em jogatinas e dissoluto, o escritor norte-americano Edgar Allan Poe morreu há 160 anos. Nasceu há 200. No umbral de seu quarto, à semelhança do corvo que se empoleira no parapeito da janela que figura em The raven (ao lado, a tradução do poema feita pelo português Fernando Pessoa), acompanharam-no alguns ramos que, desfiados e estendidos, tomaram forma de gêneros literários. Caso das literaturas policial, de ficção científica, mistério, aventura. “Como bem disse Arthur Conan Doyle, criador do Sherlock Holmes, ‘cada história sua é uma raiz da qual evoluiu toda uma literatura’”, escreveu a O POVO o jornalista e músico Roberto Muggiati.
Curitibano, Muggiati tem duas paixões. A primeira e mais arrebatadora é o jazz. Sobre o ritmo, escreveu muitos livros: para a Editora Brasiliense, o pequeno manual O que é jazz. Para a Best Seller, o volume Improvisando soluções – o jazz como exemplo para alcançar o sucesso. Nas horas vagas, e muitas vezes nas preenchidas também, Muggiati cultua outro emblema norte-americano: Poe, cuja literatura descobriu casualmente, numa aula “com um daqueles ingleses perdidos nos trópicos”. Por telefone e e-mail, Muggiati, autor de reportagens sobre o criador do romance policial, descreveu a experiência. “Meu pai era agente de seguros e o inglês, que devia dinheiro para ele, pagou com aulas para mim. Como o próprio Poe, o professor acabaria depois sofrendo de delirium tremens. Um dos primeiros textos do manual que lemos foi The Cask of Amontillado (O barril de Amontillado), justamente um dos contos mais famosos de Poe.” No texto, escrito em 1846, um homem conduz seu desafeto a uma adega que mantém em casa, nos fundos de um corredor estreito e úmido. Lá, por vingança, empareda-o. “Foi um dos primeiros textos literários que me impressionaram de verdade.” Muggiati tinha dez anos quando leu a trama. Foi arrebatado.
A tensão ascendente
Previstos em artigos elaborados pelo escritor norte-americano Edgar Allan Poe (1809-1849) e publicados em jornais, os efeitos dos “contos do grotesco e do arabesco” parecem manter-se inalterados. Neles, o leitor depara-se com uma historieta sem pretensões à verdade. Traiçoeiramente banal, próxima do cotidiano. Um narrador decide revelar algum aspecto de um fato curioso que lhe ocorreu ou que testemunhou. Não pede que lhe creiam numa vírgula. Apenas quer despir-se de um peso mortal, representado pelo que viu, ouviu ou sentiu. Assim começa grande parte das short stories de Poe. É infalível. Algumas páginas depois, o bote vem certeiro. Após preparar o terreno, o fim arrasador define-se. É aí que o leitor de Poe vê-se arrebatado por suas armações literárias.
Ainda que narrem aventuras aterradoras e jogos de mistério e horror, os contos de Poe partem invariavelmente dessa premissa. Uma leitura atual de sua obra vislumbrará abismos e veredas escuras semelhantes aos enfrentados por leitores dos séculos passados. A sombra que a envergadura do corvo projeta tem encoberto autores dos mais variados matizes literários. A influência injetada por contos e poemas de Poe atravessa nomes e gêneros, atingindo escritores diversos. Como o argentino Jorge Luis Borges e norte-americano Stephen King.
O ANO DE 2009 CONDENSA MORTE E VIDA PARA O ESCRITOR EDGAR ALLAN POE. NO ÚLTIMO DIA 19, FORAM CELEBRADOS 200 ANOS DE NASCIMENTO DO AUTOR DE O CORVO. TAMBÉM EM 2009, É LEMBRADO O DIA EM QUE POE FOI ENCONTRADO MORTO NUMA RUAZINHA DE BALTIMORE, NOS ESTADOS UNIDOS. NESTE DOMINGO, O VIDA E ARTE CULTURA CONSTATA: 160 ANOS DEPOIS, POE PERMANECE VIVO
HENRIQUE ARAÚJO>>>ESPECIAL PARA O POVO
Metade corvo, metade Edgar A. Poe, uma ave de penas lustrosas alçou vôo no começo do século XIX. Duzentos anos depois, o bater das asas do animal ainda faz estremecer. Ouvindo-o, leitores no mundo inteiro sentem calafrios, pequenos sustos ou arrepios que podem se estender por horas ou dias. Impressionam-se com a narrativa do sobrenatural, do extra-humano, a mesma que suspende o raciocínio por meio do terror e provoca reflexões usando o grotesco como passaporte. O inumano: eis a argamassa edificante da literatura de Poe.
Bêbado, viciado em jogatinas e dissoluto, o escritor norte-americano Edgar Allan Poe morreu há 160 anos. Nasceu há 200. No umbral de seu quarto, à semelhança do corvo que se empoleira no parapeito da janela que figura em The raven (ao lado, a tradução do poema feita pelo português Fernando Pessoa), acompanharam-no alguns ramos que, desfiados e estendidos, tomaram forma de gêneros literários. Caso das literaturas policial, de ficção científica, mistério, aventura. “Como bem disse Arthur Conan Doyle, criador do Sherlock Holmes, ‘cada história sua é uma raiz da qual evoluiu toda uma literatura’”, escreveu a O POVO o jornalista e músico Roberto Muggiati.
Curitibano, Muggiati tem duas paixões. A primeira e mais arrebatadora é o jazz. Sobre o ritmo, escreveu muitos livros: para a Editora Brasiliense, o pequeno manual O que é jazz. Para a Best Seller, o volume Improvisando soluções – o jazz como exemplo para alcançar o sucesso. Nas horas vagas, e muitas vezes nas preenchidas também, Muggiati cultua outro emblema norte-americano: Poe, cuja literatura descobriu casualmente, numa aula “com um daqueles ingleses perdidos nos trópicos”. Por telefone e e-mail, Muggiati, autor de reportagens sobre o criador do romance policial, descreveu a experiência. “Meu pai era agente de seguros e o inglês, que devia dinheiro para ele, pagou com aulas para mim. Como o próprio Poe, o professor acabaria depois sofrendo de delirium tremens. Um dos primeiros textos do manual que lemos foi The Cask of Amontillado (O barril de Amontillado), justamente um dos contos mais famosos de Poe.” No texto, escrito em 1846, um homem conduz seu desafeto a uma adega que mantém em casa, nos fundos de um corredor estreito e úmido. Lá, por vingança, empareda-o. “Foi um dos primeiros textos literários que me impressionaram de verdade.” Muggiati tinha dez anos quando leu a trama. Foi arrebatado.
A tensão ascendente
Previstos em artigos elaborados pelo escritor norte-americano Edgar Allan Poe (1809-1849) e publicados em jornais, os efeitos dos “contos do grotesco e do arabesco” parecem manter-se inalterados. Neles, o leitor depara-se com uma historieta sem pretensões à verdade. Traiçoeiramente banal, próxima do cotidiano. Um narrador decide revelar algum aspecto de um fato curioso que lhe ocorreu ou que testemunhou. Não pede que lhe creiam numa vírgula. Apenas quer despir-se de um peso mortal, representado pelo que viu, ouviu ou sentiu. Assim começa grande parte das short stories de Poe. É infalível. Algumas páginas depois, o bote vem certeiro. Após preparar o terreno, o fim arrasador define-se. É aí que o leitor de Poe vê-se arrebatado por suas armações literárias.
Ainda que narrem aventuras aterradoras e jogos de mistério e horror, os contos de Poe partem invariavelmente dessa premissa. Uma leitura atual de sua obra vislumbrará abismos e veredas escuras semelhantes aos enfrentados por leitores dos séculos passados. A sombra que a envergadura do corvo projeta tem encoberto autores dos mais variados matizes literários. A influência injetada por contos e poemas de Poe atravessa nomes e gêneros, atingindo escritores diversos. Como o argentino Jorge Luis Borges e norte-americano Stephen King.
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