Essa sucessão de placas no cemitério.
Jazigos de crianças, velhos, adolescentes, mulheres e homens, todos mortos e
agora enterrados, alguns mais recentes, outros não, uns poucos chegando naquele
momento.
Procuramos o lugar da minha
avó. Está em meio a tanta gente. Três anos atrás fomos até lá e o lote novo
tinha poucos visitantes. Era uma nova fronteira no cemitério, já
apinhado de caixões e com uma fila à espera de mais espaço.
Agora estava tudo cheio
novamente. Do outro lado, mais pro norte, um lote mais novo era aberto. No
meio do terreno, uma área daria lugar a um edifício, uma construção. Um
desses prédios construídos com dinheiro do governo para habitações populares. Mas não era isso. Era mais um lugar para os mortos.
Passei por uma criança e
depois por outra e me perguntei sobre o lugar que as pessoas ocupam depois que partem. Mesmo as mortas não morrem de todo, continuam lá e aqui, indo e vindo como se passeasssem ao gosto, por desejo próprio. Mortos e sem compromisso, vão e vêm, tomam sol e se surpreendem com a primavera. Os vivos sabem menos disso, o que não os impede de transitar também, tornando o esquecimento uma atividade custosa, quase impossível. Só se esquece plenamente quando decidimos lembrar.
Mais placas e placas. E finalmente uma que chama a atenção. Uma criança. Em vez da pedra habitual e as inscrições com data de nascimento e de morte, uma casinha de bonecas, com meninas e meninos em miniatura espalhados por cômodos. Num deles, a foto da garotinha. Não lembro o seu nome.
Tudo isso foi há algum tempo, em agosto talvez, quando visitei minha avó morta pela primeira vez. Eu precisava chorar, então fui porque tinha de desfazer esse nó. Fui até ela para engolir o nó ou cuspi-lo. Não consegui nem uma coisa nem outra.
Estava com meus pais, irmão e sobrinha. Não lembrava quando tínhamos feito isso antes daquele momento. Quando havíamos saído de casa assim, como uma família, todos no mesmo carro.
A Duda pediu pra colocar uma banda sul-coreana pra tocar no meu celular. Eu pus Anitta achando que a agradaria, mas ela revirou os olhos e disse algo como: "Não esperava isso do senhor, tio. Uma pessoa tão culta".
Mais placas e placas. E finalmente uma que chama a atenção. Uma criança. Em vez da pedra habitual e as inscrições com data de nascimento e de morte, uma casinha de bonecas, com meninas e meninos em miniatura espalhados por cômodos. Num deles, a foto da garotinha. Não lembro o seu nome.
Tudo isso foi há algum tempo, em agosto talvez, quando visitei minha avó morta pela primeira vez. Eu precisava chorar, então fui porque tinha de desfazer esse nó. Fui até ela para engolir o nó ou cuspi-lo. Não consegui nem uma coisa nem outra.
Estava com meus pais, irmão e sobrinha. Não lembrava quando tínhamos feito isso antes daquele momento. Quando havíamos saído de casa assim, como uma família, todos no mesmo carro.
A Duda pediu pra colocar uma banda sul-coreana pra tocar no meu celular. Eu pus Anitta achando que a agradaria, mas ela revirou os olhos e disse algo como: "Não esperava isso do senhor, tio. Uma pessoa tão culta".
Já no cemitério, nos espalhamos e mais uma vez senti que nossa família sempre havia sido assim, pessoas juntadas casualmente e obrigadas a viver agora sob o mesmo teto. Enquanto procurávamos a vó, eu meio que inspecionava os jazigos. Tanta gente e nenhuma razão. Eram as razões, os motivos que eu procurava para tudo, não apenas pra morte. Por quê?
Não havia nada lá, apenas rostos e datas que não queriam dizer muita coisa, exceto para os parentes daquelas pessoas. Nenhum motivo para a morte. Os mortos eram folhas em branco, no máximo podíamos adivinhar as circunstâncias. As famílias sonegavam informações básicas sobre os seus. Sempre achei isso um comportamento tacanho.
Era algo que não custaria tanto incluir. Maria, morta de câncer. João, atropelamento. Janaína, velhice. Fernando, morto jovem ainda quando não se sabia que o fim chegava tão cedo.
Não havia nada lá, apenas rostos e datas que não queriam dizer muita coisa, exceto para os parentes daquelas pessoas. Nenhum motivo para a morte. Os mortos eram folhas em branco, no máximo podíamos adivinhar as circunstâncias. As famílias sonegavam informações básicas sobre os seus. Sempre achei isso um comportamento tacanho.
Era algo que não custaria tanto incluir. Maria, morta de câncer. João, atropelamento. Janaína, velhice. Fernando, morto jovem ainda quando não se sabia que o fim chegava tão cedo.
Comentários