Eu passei por ele e lembrei
que é bem ali onde as turmas de formandos se reúnem para fazer fotografias
segurando os nomes dos cursos de graduação e o ano em que estão concluindo. É um
lugar apropriado para fincar a bandeira do marco, estabelecer um ponto zero e
começar seja lá o que for, desde que represente uma virada na sua vida, uma
página que fica pra trás ou coisa que o valha.
Pois foi exatamente lá, perto
da estátua da Iracema, que apareceu da noite pro dia o letreiro CEARÁ com
letras coloridas dispostas como numa lâmina de apresentação para dizer coisas
óbvias. Caso alguém vá passando e não tenha tanta certeza de onde está, um
turista ou mesmo um desavisado, a placa cuida em informar: CEARÁ.
Letras alegres, dançantes,
como a explicitar cabalmente nossa vocação para a alegria. Um reconhecimento tácito
de nossa felicidade. Um clichê tipográfico e afetivo. E enterrado na praia,
como uma placa de vende-se em Jeri.
Letreiro estranho. O nome
inscrito na orla pede que a gente olhe pra ele com simpatia, uma generosidade que
é a base desse sentimento por trás do pertencimento. Estamos no Ceará. Olho e
sinto o mesmo quando vejo uma dessas carinhas sorrindo e dizendo: você está
sendo filmado.
Você está no CEARÁ. Parabéns.
Mas também gosto do letreiro.
Tem patrocínio privado, é verdade, mais uma noção falsa de vínculo que se cria
na marra, à força, como quase tudo na terra. Gosto assim mesmo. Gosto apesar de
saber que nossas raízes são aéreas e tudo o que é antigo e portanto patrimônio
não resiste à ação do poder. Gosto por gostar, gosto por insistência, gosto por
achar que me salvo gostando de graça. Melhor oferecer que cobrar. Xingo o
letreiro, mas gosto como gosto da própria cidade.
Gosto inclusive da ironia que
é o fato de letreiro e dunas do Cocó ocuparem posições radicalmente opostas
hoje em dia. Enquanto o CEARÁ surge espalhafatoso no cartão-postal litorâneo
para demarcar ainda mais no imaginário do turista a identidade da praia, a lei
que protegia um conjunto de dunas no Cocó foi revogada. Tudo ao mesmo tempo. Um aparece, outra
desaparece. Um tem destaque e patrocínio de jornal, outra é ignorada.
Na primeira vez que vi quis
emburrar, mas segui mais uns passos e acabei simpatizando. É tão brega e tão
nosso, assim como os trenzinhos da alegria no circuito da Abolição com a trupe
de heróis esfarrapados escorregando de barriga no parapeito da fachada do hotel. Assim
como o quebra-coco.
Um chiaroscuro de felicidade
e tristeza, lusco-fusco de saber-se incapaz e potente. Uma mistura de coisas
que fazem desta a terra das oportunidades, quase todas perdidas.
Quem precisa mesmo de dunas?
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