Fui ali e não voltei.
Fiquei na estrada, me perdi, parei pra
amarrar os cadarços do tênis enquanto todos caminhavam. Agachei um pouco, a
vista escureceu, não cheguei a desmaiar, mas foi o suficiente pra perder
contato visual com o restante do grupo, que se distanciou sem que eu percebesse
e no entanto ter sido deixado pra trás não me causou tanto espanto quanto
deveria, a julgar por minhas próximas ações, a saber:
Desamarrar os cadarços mentalmente, eleger
o tronco de uma árvore perto como o mais bonito e intrincado tronco de árvore
jamais visto, entender que não há mais nada para entender e, o instante
reluzente de tudo isso, checar as horas apenas por gosto e
não por pressão, exatamente como quem não espera algo que não virá, mas o que virá, e de maneira tranquila percorre as prateleiras do supermercado detendo-se de tempos em tempos numa embalagem bonita de achocolatado.
Logo me pus novamente de pé, a coluna
espichada, cabelo assanhado pelo vento. Fazia um dia bonito como são bonitos os
dias em que acordamos bem dispostos e num piscar de olhos tudo parece fazer
sentido e o curso natural da vida não poderia ter resultado em algo melhor.
Estava sozinho, não tinha dúvida. Falava e
ninguém respondia, andava e não esbarrava em nada, cantava e nenhuma voz
prosseguia.
O sonho continuava de uma forma estranha: a
gente (presumo que não estivesse só) entrava numa casa pedindo água e essa mulher anunciava sem pânico
aparente a chegada de um exército que varreria a região à procura de
clandestinos.
Clandestinos?
Sim, gente como vocês. Então soaram batidas
fortes na porta de madeira. Quem será? A dona da casa pediu que nos
escondêssemos dentro da geladeira desativada, entre vassouras e roupas sujas, e
foi atender a porta.
Era o carteiro, que tratou de pedir mil
desculpas porque hoje, infelizmente, não havia cartas.
O carteiro foi embora.
Temendo o pior, a dona da casa decidiu que finalmente chegara a hora esperada. Não voltou mais.
Olhei para o lado ainda dentro da geladeira, agora totalmente resfriada, e verifiquei sem precisar recorrer a muitos cálculos que estava sozinho novamente e, para piorar ou melhorar a situação, prestes
a encarar a terceira e última parte do sonho, que, de tão confusa, pode ser
resumida assim:
Eu só queria ter decorado o seu nome.