Ver tipo 450 mililitros de leucócitos, eritrócitos e fatores de coagulação saindo vagarosamente do seu braço por meio de um tubo plástico translúcido e entrando numa bolsa bem parecida com aquela nécessaire que a sua mãe usa quando tem de ir fazer as unhas foi algo que Felipe super não queria ter visto.
Não às oito da manhã de uma terça-feira gorda, quase reimosa.
Mas foi o que Felipe super viu. Estirado numa maca, ainda sonolento, assistia inquieto um líquido vermelho indispensável ser bombeado de seu corpo magro, mas acima do peso exigido: 50 kg. Tava mais pra figurante de um dos Jogos Mortais. Tipo o cara que morre primeiro e serve como aperitivo para as muitas outras mortes que ainda virão? Ele se sentia bem assim.
Tudo porque do outro lado da cidade tinha esse cara imbecil que super sabe dirigir mas quase nunca faz isso sóbrio. Então tinha esse cara deitado numa cama que as pessoas chamam na boa de leito de hospital. E tipo a situação dele era grave, precisava de algumas bolsinhas de sangue como a que o Felipe agora mesmo tava dando sem nem mesmo pensar que depois dali ia ter direito a um misto-quente e um suco que pode ser de caju, goiaba, maracujá, essas frutas todas. Bom, o nome desse cara é Marcos, os amigos chamam de Marcão porque também é assim que a família dele chama.
Resumo do resumo: o Marcos ou Marcão vinha no Pálio acabado dele, cinco metros vazios de cada lado da pista, mas ele super preferiu atravessar esse vazio e dar de cara num poste desses que a prefeitura gosta de colocar embelezando a cidade. Ou qualquer coisa do tipo.
Final da história: o Marcos ou Marcão agora tipo precisa das bolsas para abandonar aquela palidez de vampiro, que foi uma coisa natural que aconteceu com ele. Natural assim: depois da colisão, uma paulada mesmo, o Marcos, que vinha sozinho, ficou que nem os bonecos de teste, os bonecos que a Honda e Volks usam para fazer testes... Tipo de resistência do pára-choque dos carros. Daí os bonecos vão e vão e vão até o carro bater de chapa numa parede e eles se alongarem e contraírem como se fossem molas. O Marcos super imitou esses caras, os bonecos. Mas sem o cinto, saca?
Agora o fim do fim mesmo, de verdade: o Marcos, que o Felipe conheceu ontem na praia, tava querendo uns mililitros da coisa vermelha tipo vital que circula nas rodovias intravenosas da galera. Mas tem que ser na boa, tipo sem doença, sem HIV, sem Hepatite B e C, sem gripe ou febre, sem álcool nas últimas 12 horas e sem um bocado de coisa ruim. Porque o Marcos super só escapa se tiver esse sangue todo estocado pra tipo na hora da cirurgia que ele vai ter de fazer usar, tá entendendo? Ele lá, aberto, sei lá, do pescoço pra baixo, e o sangue bonitinho, do tipo que precisa, compatível, esperando gelado na geladeira. Ele fica na geladeira, né? Deve ser, do contrário estraga.
Sangue pra estragar é que nem leite tipo C.
Daí que super vale doar sangue como o Felipe tá fazendo agora ali, meio caidão na cadeira inclinada vendo umas besteiras de escola de samba na televisão. Tudo bem que no caso dele vale também porque tipo o Marcos ou Marcão e ele vão ficar amigos e quando o Felipe precisar de sangue o cara que ele ajudou super vai retribuir, na boa mesmo. Mas não apenas por isso. Quer dizer, tem que pensar na vida que tu tá ajudando a salvar, saca? Não no histórico do cara, mas na vida dele.
Não às oito da manhã de uma terça-feira gorda, quase reimosa.
Mas foi o que Felipe super viu. Estirado numa maca, ainda sonolento, assistia inquieto um líquido vermelho indispensável ser bombeado de seu corpo magro, mas acima do peso exigido: 50 kg. Tava mais pra figurante de um dos Jogos Mortais. Tipo o cara que morre primeiro e serve como aperitivo para as muitas outras mortes que ainda virão? Ele se sentia bem assim.
Tudo porque do outro lado da cidade tinha esse cara imbecil que super sabe dirigir mas quase nunca faz isso sóbrio. Então tinha esse cara deitado numa cama que as pessoas chamam na boa de leito de hospital. E tipo a situação dele era grave, precisava de algumas bolsinhas de sangue como a que o Felipe agora mesmo tava dando sem nem mesmo pensar que depois dali ia ter direito a um misto-quente e um suco que pode ser de caju, goiaba, maracujá, essas frutas todas. Bom, o nome desse cara é Marcos, os amigos chamam de Marcão porque também é assim que a família dele chama.
Resumo do resumo: o Marcos ou Marcão vinha no Pálio acabado dele, cinco metros vazios de cada lado da pista, mas ele super preferiu atravessar esse vazio e dar de cara num poste desses que a prefeitura gosta de colocar embelezando a cidade. Ou qualquer coisa do tipo.
Final da história: o Marcos ou Marcão agora tipo precisa das bolsas para abandonar aquela palidez de vampiro, que foi uma coisa natural que aconteceu com ele. Natural assim: depois da colisão, uma paulada mesmo, o Marcos, que vinha sozinho, ficou que nem os bonecos de teste, os bonecos que a Honda e Volks usam para fazer testes... Tipo de resistência do pára-choque dos carros. Daí os bonecos vão e vão e vão até o carro bater de chapa numa parede e eles se alongarem e contraírem como se fossem molas. O Marcos super imitou esses caras, os bonecos. Mas sem o cinto, saca?
Agora o fim do fim mesmo, de verdade: o Marcos, que o Felipe conheceu ontem na praia, tava querendo uns mililitros da coisa vermelha tipo vital que circula nas rodovias intravenosas da galera. Mas tem que ser na boa, tipo sem doença, sem HIV, sem Hepatite B e C, sem gripe ou febre, sem álcool nas últimas 12 horas e sem um bocado de coisa ruim. Porque o Marcos super só escapa se tiver esse sangue todo estocado pra tipo na hora da cirurgia que ele vai ter de fazer usar, tá entendendo? Ele lá, aberto, sei lá, do pescoço pra baixo, e o sangue bonitinho, do tipo que precisa, compatível, esperando gelado na geladeira. Ele fica na geladeira, né? Deve ser, do contrário estraga.
Sangue pra estragar é que nem leite tipo C.
Daí que super vale doar sangue como o Felipe tá fazendo agora ali, meio caidão na cadeira inclinada vendo umas besteiras de escola de samba na televisão. Tudo bem que no caso dele vale também porque tipo o Marcos ou Marcão e ele vão ficar amigos e quando o Felipe precisar de sangue o cara que ele ajudou super vai retribuir, na boa mesmo. Mas não apenas por isso. Quer dizer, tem que pensar na vida que tu tá ajudando a salvar, saca? Não no histórico do cara, mas na vida dele.
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