Comecei a desconfiar dessa pororoca de títulos no imperativo, a exemplo de não olhe pra cima, não fale, não diga seu nome, não, não olhe, não se mexa, enfim, uma série de sentenças cujo papel é estabelecer um veto a quem quer que leia/veja/assista um produto que se destina exatamente a ser lido/visto/assistido.
De modo que, ao menos em princípio, trata-se de um contrassenso, um paradoxo: instituir como pacto o princípio da não leitura com uma audiência escapadiça.
Esse impeditivo é apenas uma isca para o jogo, evidentemente, o gesto que deflagra um “faz-de-conta”, capturando essa atenção difusa que circula descompromissada entre os itens de uma oferta inesgotável nas prateleiras das plataformas.
Talvez haja nele mais que apenas artifício. Mas o quê? Tenho apenas suspeitas, hipóteses mal formuladas que não explicam de todo, no entanto ajudam, eu espero – logo eu, que nunca resisto à isca da vedação, que sempre olho pra cima, digo o nome e me mexo quando a sugestão é o contrário.
E quem sabe esteja aí a chave da leitura, qual seja, o imperativo é tão somente retórico, ferramenta situada num esquema no qual o destinatário da mensagem interpreta que a elocução não pretende de fato impedi-lo de nada, mas produzir uma chispa de curiosidade – o que há do outro lado, acima ou abaixo, às costas ou à frente?
É possível, no entanto, que o imperativo nessas obras tenha ainda uma outra função, que é a de endereçar o “Mal” (com maiúscula mesmo, porque essencializado) a um campo presumido do real, isto é, ele existe, sim, como entidade absolutizada que exorbita o mundo físico.
O mal é um visitante, uma força cuja presença se sente porque está em desacordo com as regras do mundo conhecido – a criatura planando entre as nuvens no filme do Jordan Peele, por exemplo, extraterrena e imiscível.
Logo, a ameaça é de outra natureza: vaga, impalpável, insidiosa, além-mundo.
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