Há descompasso, que é descompasso? É desentendimento
nos quereres e poderes, assim, pluralizados, de modo que impera agora
sentimento desgovernado, dito desta maneira soa até leviano, bobo,
ridiculamente infantil, mas o fato é que há sempre descompasso entre o querer
nosso e o querer da realidade, sendo a última mais forte, incontornável e
indiferente, só nos resta colocar a viola no saco e partir – partir ao meio,
encerrando cada coisa em seu lugar, ou partir, encaminhando-se diligentemente à
porta de saída, se bem me entendem há maneiras e maneiras de cotejar o desejo,
confrontar a parede, nenhuma delas exige menos que a dor, nenhuma concede salvo-conduto,
nenhuma abre mão de uma boa briga, a todos o meu muito boa sorte.
Numa dessas andanças pelo shopping, o anúncio saltou da fachada da loja: “museu da selfie”. As palavras destacadas nessa luminescência característica das redes, os tipos simulando uma caligrafia declinada, quase pessoal e amorosa, resultado da combinação do familiar e do estranho, um híbrido de carta e mensagem eletrônica. “Museu da selfie”, repeti mentalmente enquanto considerava pagar 20 reais por um saco de pipoca do qual já havia desistido, mas cuja imagem retornava sempre em ondas de apelo olfativo e sonoro, a repetição do gesto como parte indissociável da experiência de estar numa sala de cinema. Um museu, por natureza, alimenta-se de matéria narrativa, ou seja, trata-se de espaço instaurado a fim de que se remonte o fio da história, estabelecendo-se entre suas peças algum nexo, seja ele causal ou não. É, por assim dizer, um ato de significação que se estende a tudo que ele contém. Daí que se fale de um museu da seca, um museu do amanhã, um museu do mar, um museu da língua e por