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O futuro

Conversamos sobre dualidade, pares ordenados e quejandos, sobre como isso é importante e desimportante pra gente que conheço e pra gente que não conheço. Como o pensamento se organiza em torno desses polos, e, nessa organização, como também ignora tudo que não é extremo, dando frequentemente com os burros n’água, mas também se fortalecendo.

Fortaleza. Fortalecer-se. Há uma força aí que talvez seja demasiada.
Que tal o desamparo, a fraqueza? Apenas uma ideia.  

A gente pensa e pensa e faz e faz e sonha e sonha. E continua a pensar e pensar, sonhar de vez em quando, amar quando é possível. Depois a fazer raramente, sonhar quando as condições estão favoráveis e a sonhar apenas quando se dá conta de que as coisas tinham uma cara diferente uns anos atrás.

A imagem de uma praia poluída cujo nome frutifica futuro.

É como se dissessem: o futuro de vocês está ali, mas ninguém pode entrar. O futuro está barrado, fechado, cercado por barracas cada vez maiores, com piscinas de águas limpas e música ao vivo e caranguejada às quintas-feiras.

O futuro é isso: existe, mas impróprio. Podem contemplar, apenas. Olhem bastante. O futuro ficou para depois.

Isso tem tudo a ver com tudo.  

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