A amiga
saltou, o amigo também. De repente, todos estavam saltando. Todos depois que
todos os outros antes deles tinham saltado. Mas isso foi noutra época. Uma época
em que se podia saltar em paz, sem ser atrapalhado por ninguém que atravessava
a cidade de carro, mas também de bicicleta, para, depositando as coisas num
cantinho, perguntar se alguém olhava e pá, pular do alto da ponte direto no
mar. A falta de jeito era parte do charme. Afinal, ninguém antes dele ou antes
dela tinha saltado da ponte. Ninguém com mestrado e doutorado. Ninguém que sabia
ler com fluência textos em três idiomas havia saltado da ponte antes dele. E
ele também queria. E saltou. E gostou do salto, que durou menos tempo do que a saudade que tinha quando estava em casa e não podia saltar. Durou tanto tempo
que, enquanto saltava, no meio do desenho que o corpo vai fazendo no ar, esse
arco meio torto, é verdade, pensou se já não seria tempo de voltar a dizer o
que antes tinha medo de dizer. Enquanto caía, nessa trajetória errada de pulo
que, no final, acaba dando certo, considerou a possibilidade de ao menos uma
vez estar diante dele ou diante dela e oferecer algo além de um sorriso atrás
do qual se escondia como um bicho numa touceira no meio do mato. Pensou que
podia, sim, mas aí já tinha caído e mergulhado e agora as bolhas e os sons se
misturavam ao barulho do zumbido e à ardência nas pernas e braços. Agora ele
também tinha saltado. Podia dizer. Eu pulei. E foi bom. Gostei. Saltou tantas
vezes naquela tarde que voltou pra casa achando um erro da evolução termos
ficado de pé muitos anos atrás e, antes disso, termos deixado a água, que é
realmente o melhor lugar do mundo. Na água ninguém sente que precisa saltar
para chegar a qualquer lugar.
Tenho ouvido cada vez mais “troca” como sinônimo de diálogo, ou seja, o ato de ter com um interlocutor qualquer fluxo de conversa, amistosa ou não, casual ou não, proveitosa ou não. No caso de troca, porém, trata-se sempre de uma coisa positiva, ao menos em princípio. Trocar é desde logo entender-se com alguém, compreender seu ponto de vista, colocar-se em seu lugar, mas não apenas. É também estar a par das razões pelas quais alguém faz o que faz, pensa o que pensa e diz o que diz. Didatizando ainda mais, é começar uma amizade. Na nomenclatura mercantil/militar de hoje, em que concluir uma tarefa é “entrega”, malhar é “treinar”, pensar na vida é “reconfigurar o mindset” e praticar é “aprimorar competências”, naturalmente a conversa passa à condição de troca. Mas o que se troca na troca de fato? Que produto ou substância, que valores e capitais se intercambiam quando duas ou mais pessoas se põem nessa condição de portadores de algo que se transmite? Fiquei pensando nisso mais te...
