A amiga
saltou, o amigo também. De repente, todos estavam saltando. Todos depois que
todos os outros antes deles tinham saltado. Mas isso foi noutra época. Uma época
em que se podia saltar em paz, sem ser atrapalhado por ninguém que atravessava
a cidade de carro, mas também de bicicleta, para, depositando as coisas num
cantinho, perguntar se alguém olhava e pá, pular do alto da ponte direto no
mar. A falta de jeito era parte do charme. Afinal, ninguém antes dele ou antes
dela tinha saltado da ponte. Ninguém com mestrado e doutorado. Ninguém que sabia
ler com fluência textos em três idiomas havia saltado da ponte antes dele. E
ele também queria. E saltou. E gostou do salto, que durou menos tempo do que a saudade que tinha quando estava em casa e não podia saltar. Durou tanto tempo
que, enquanto saltava, no meio do desenho que o corpo vai fazendo no ar, esse
arco meio torto, é verdade, pensou se já não seria tempo de voltar a dizer o
que antes tinha medo de dizer. Enquanto caía, nessa trajetória errada de pulo
que, no final, acaba dando certo, considerou a possibilidade de ao menos uma
vez estar diante dele ou diante dela e oferecer algo além de um sorriso atrás
do qual se escondia como um bicho numa touceira no meio do mato. Pensou que
podia, sim, mas aí já tinha caído e mergulhado e agora as bolhas e os sons se
misturavam ao barulho do zumbido e à ardência nas pernas e braços. Agora ele
também tinha saltado. Podia dizer. Eu pulei. E foi bom. Gostei. Saltou tantas
vezes naquela tarde que voltou pra casa achando um erro da evolução termos
ficado de pé muitos anos atrás e, antes disso, termos deixado a água, que é
realmente o melhor lugar do mundo. Na água ninguém sente que precisa saltar
para chegar a qualquer lugar.
Numa dessas andanças pelo shopping, o anúncio saltou da fachada da loja: “museu da selfie”. As palavras destacadas nessa luminescência característica das redes, os tipos simulando uma caligrafia declinada, quase pessoal e amorosa, resultado da combinação do familiar e do estranho, um híbrido de carta e mensagem eletrônica. “Museu da selfie”, repeti mentalmente enquanto considerava pagar 20 reais por um saco de pipoca do qual já havia desistido, mas cuja imagem retornava sempre em ondas de apelo olfativo e sonoro, a repetição do gesto como parte indissociável da experiência de estar numa sala de cinema. Um museu, por natureza, alimenta-se de matéria narrativa, ou seja, trata-se de espaço instaurado a fim de que se remonte o fio da história, estabelecendo-se entre suas peças algum nexo, seja ele causal ou não. É, por assim dizer, um ato de significação que se estende a tudo que ele contém. Daí que se fale de um museu da seca, um museu do amanhã, um museu do mar, um museu da língua e por