Pular para o conteúdo principal

Óculos de realidade diminuída




Agora que o HSBC resolveu de moto próprio alargar o horizonte dos meus sonhos aumentando o limite do meu cartão de 800 reais para 1.150 reais, limite este que contrasta com aquele, autoimposto já havia três anos em virtude de minha faceta consumista quando se trata de jogos, livros, revistas etc., além de iogurte grego; levando-se em conta igualmente a excitação que, por meio de uma correia de transmissão invisível, se espalhou feito doença venérea e agora está contaminando todo mundo que conheço horas antes da apresentação do Paul; considerando-se, finalmente, atendidas as expectativas da semana, que se não eram tantas nem complexas tampouco pareciam simples ou exeqüíveis em um nível primário; pensando em tudo isso e mais ainda no que disse o tradutor e escritor Cabra Preta no blog do IMS, cujos tópicos recomendo como leitura imprescindível a quem quer que pretenda colocar uma vírgula que seja no papel daqui pra frente.

Dito isso, a única saída que me resta é deixar de fininho a arena pública da inflação opinativa e discretamente assumir como meta do fim de semana conseguir bons ingressos para algumas horas de lambada antes que a segunda-feira nos alcance com sua bocarra desdentada, mas fatalmente malcheirosa, que pode demorar, mas nunca tarda.

Sendo assim, tendo em vista que o táxi já bate à porta e sempre que olho para os lados enxergo inúmeros motivos para desistir e ficar em casa vendo algum filme bacana, desses que dão um prazer danado quando vemos por acaso, me despeço desde já da virgindade dos grandes astros – afinal, a maior celebridade a que assisti até hoje em minha curta vida de jovem adulto talvez tenha sido... ninguém. Nunca mesmo, ninguém, então.

Paul será o primeiro, único talvez, quem sabe o início de uma série, provavelmente não, certamente não.

A moça liga, estou atravessando a avenida e é importante dizer que dentro de instantes daremos início à nossa programação normal da quinta-feira.

Saravá, espero apenas voltar pra casa exatamente como saí, mal-humorado e cheio  de cabelos nas orelhas.   

Postagens mais visitadas deste blog

Trocas e trocas

  Tenho ouvido cada vez mais “troca” como sinônimo de diálogo, ou seja, o ato de ter com um interlocutor qualquer fluxo de conversa, amistosa ou não, casual ou não, proveitosa ou não. No caso de troca, porém, trata-se sempre de uma coisa positiva, ao menos em princípio. Trocar é desde logo entender-se com alguém, compreender seu ponto de vista, colocar-se em seu lugar, mas não apenas. É também estar a par das razões pelas quais alguém faz o que faz, pensa o que pensa e diz o que diz. Didatizando ainda mais, é começar uma amizade. Na nomenclatura mercantil/militar de hoje, em que concluir uma tarefa é “entrega”, malhar é “treinar”, pensar na vida é “reconfigurar o mindset” e praticar é “aprimorar competências”, naturalmente a conversa passa à condição de troca. Mas o que se troca na troca de fato? Que produto ou substância, que valores e capitais se intercambiam quando duas ou mais pessoas se põem nessa condição de portadores de algo que se transmite? Fiquei pensando nisso mais te...

Atacarejo

Gosto de como soa atacarejo, de seu poder de instaurar desde o princípio um universo semântico/sintático próprio apenas a partir da ideia fusional que é aglutinar atacado e varejo, ou seja, macro e micro, universal e local, natureza e cultura e toda essa família de dualismos que atormentam o mundo ocidental desde Platão. Nada disso resiste ao atacarejo e sua capacidade de síntese, sua captura do “zeitgeist” não apenas cearense, mas global, numa amostra viva de que pintar sua aldeia é cantar o mundo – ou seria o contrário? Já não sei, perdido que fico diante do sem número de perspectivas e da enormidade contida na ressonância da palavra, que sempre me atraiu desde que a ouvi pela primeira vez, encantado como pirilampo perto da luz, dardejado por flechas de amor – para Barthes a amorosidade é também uma gramática, com suas regras e termos, suas orações subordinadas ou coordenadas, seus termos integrantes ou acessórios e por aí vai. Mas é quase certo que Barthes não conhecesse atacarejo,...

Projeto de vida

Desejo para 2025 desengajar e desertar, ser desistência, inativo e off, estar mais fora que dentro, mais out que in, mais exo que endo. Desenturmar-se da turma e desgostar-se do gosto, refluir no contrafluxo da rede e encapsular para não ceder ao colapso, ao menos não agora, não amanhã, não tão rápido. Penso com carinho na ideia de ter mais tempo para pensar na atrofia fabular e no déficit de imaginação. No vazio de futuro que a palavra “futuro” transmite sempre que justaposta a outra, a pretexto de ensejar alguma esperança no horizonte imediato. Tempo inclusive para não ter tempo, para não possuir nem reter, não domesticar nem apropriar, para devolver e para cansar, sobretudo para cansar. Tempo para o esgotamento que é esgotar-se sem que todas as alternativas estejam postas nem os caminhos apresentados por inteiro. Tempo para recusar toda vez que ouvir “empreender” como sinônimo de estilo de vida, e estilo de vida como sinônimo de qualquer coisa que se pareça com o modo particular c...