Quero pedir conselhos a uma IA, recomendações sobre o que fazer nas férias escolares ou os números da Mega Sena para jogar no final do ano, mas esqueço que a inteligência artificial não é genuinamente preditiva, ou seja, não se trata de um poder oracular capaz de antecipar o futuro.
Na verdade, a IA é golpista, nesse sentido que atribuímos a alguém que se faz parecer com o que não é.
Uma estelionatária, eu acrescentaria, certo de que não estou (ainda) melindrando os sentimentos da máquina, embora tenha lá minhas dúvidas sobre a real capacidade de elaboração dos sentidos e de sua autonomia subjetiva, sobretudo quando a IA soa quase como um milagre ao sugerir livros que pretendo comprar ou afiançar a qualidade de um filme de cuja história acabo gostando.
Não sei se por profecia autorrelizável ou coisa assemelhada, o fato é que a IA costuma servir para tarefas do dia a dia, escolhas triviais das quais abro mão facilmente para economizar energia e tempo, ainda que os acabe consumindo de outra maneira, nem sempre inteligente nem produtiva, mas isso são outros quinhentos.
Tudo se passa, no entanto, como se a IA também pudesse funcionar como essa vidente digital, sua voz a de uma pitonisa encantatória com poder de adivinhação sem igual, o que não poderia estar mais errado.
E por uma razão simples: a maquinaria computacional por trás da IA apenas (ainda) processa conteúdo já existente, isto é, a massa de dados da qual a inteligência se apropria e com a qual constrói seu entendimento do mundo lhe permite tão somente prever o passado.
Quanto ao futuro, não (ainda), e aí mora o problema, porque a IA tem sido mobilizada como ferramenta para múltiplos usos, desde a validação de processos inteiramente humanos (quem sou eu?) até a gestão de atividades, entre as quais as artísticas, cuja feitura exige um grau elevado de imponderabilidade.
E nisso a máquina falha. Falha em ter com o erro uma relação criativa. Falha no potencial de invenção, de abrir horizontes, em interpretar não o já havido, esse com o qual se entende facilmente porque é melhor que qualquer um para coletar e arquivar, digerindo uma maçaroca de informações numa escala inumana.
Falha porque sua inteligência é limitada ao que não se conhece, ao novo, ao que rompe com o catalogado e descrito. E nisso há problemas e vantagens.
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