Há dias procuro um livro
específico que não sei qual é, mas a bagunça das estantes não tem ajudado.
Reviro as pilhas, inspeciono as lombadas, checo atrás das prateleiras
abarrotadas e reabro portas de armários há muito fechadas. Nada. Não está lá. É
um livro de capa fina, dessas que dobram e amassam facilmente e nas quais há
uma infinidade de marcas de dedos de todas as pessoas que manusearam o livro.
Se o folheamos, de dentro desprende-se um cheiro antigo, odor de mãos e pele e
objetos esquecidos, manchas invisíveis que foram se acumulando – uma de café,
outra de uma substância que não consigo identificar, mas que associo a
manteiga ou a algum produto gorduroso. Não recordo a história. Na verdade, não
mantive um fiapo de nada do enredo nem dos personagens, apenas a vaga noção de
que deveria encontrá-lo em algum ponto do quarto, entre as torres de pequenos
volumes nunca lidos que fui juntando e os que efetivamente li. Todavia, não é
fácil achar coisas esquecidas, e esse livro, pelo que sei, já deveria ter
aparecido. Sou bom nisso. Investigar rastros, mapeá-los até a origem e,
mediante algum esforço, identificar o ponto de partida. Mas, no caso desse
livro em especial, tenho falhado até agora. Apesar dos fracassos que se
sucederam, permaneço alerta, atento a qualquer possibilidade de que o livro
resolva aparecer por si. Uma hora, quando menos esperar, ele vai surgir ao lado
de uma revista ou sobre a escrivaninha, atravessado como um desses gatos que se
esticam no tampo da mesa antes de dormirem.
Tenho ouvido cada vez mais “troca” como sinônimo de diálogo, ou seja, o ato de ter com um interlocutor qualquer fluxo de conversa, amistosa ou não, casual ou não, proveitosa ou não. No caso de troca, porém, trata-se sempre de uma coisa positiva, ao menos em princípio. Trocar é desde logo entender-se com alguém, compreender seu ponto de vista, colocar-se em seu lugar, mas não apenas. É também estar a par das razões pelas quais alguém faz o que faz, pensa o que pensa e diz o que diz. Didatizando ainda mais, é começar uma amizade. Na nomenclatura mercantil/militar de hoje, em que concluir uma tarefa é “entrega”, malhar é “treinar”, pensar na vida é “reconfigurar o mindset” e praticar é “aprimorar competências”, naturalmente a conversa passa à condição de troca. Mas o que se troca na troca de fato? Que produto ou substância, que valores e capitais se intercambiam quando duas ou mais pessoas se põem nessa condição de portadores de algo que se transmite? Fiquei pensando nisso mais te...
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