É hora do almoço, e o restaurante fecha às 13h
em ponto. Funciona como uma repartição muito antiga de cuja pontualidade
dependesse o equilíbrio de energias universais, polos que se opõem e nessa
disputa mantêm-se entretecidos um ao outro. Mas é apenas um restaurante, lugar aonde vou
se preciso comer de manhã cedo ou no meio da tarde. Hoje ainda não comi. Estive
durante muito tempo engolfado numa espécie de nódoa. Um visco que tento
afastar, mas está aqui. Gruda, desliza, recobre o corpo, pernas e braços,
pescoço e tórax. Prende-se ao pau e aos pés. Não há como descamá-lo. Inútil desfazer-se
da sombra. Sorte se entrasse numa loja de cosméticos e me vendessem o produto
adequado para esfoliar da pele tudo que é matéria morta e veneno próprio. Mas nisso
estou com pouca sorte. A esta hora nada abre, tudo fecha. Como se disso
dependesse o arbítrio que governa cada pequena forma de vida.
Tenho ouvido cada vez mais “troca” como sinônimo de diálogo, ou seja, o ato de ter com um interlocutor qualquer fluxo de conversa, amistosa ou não, casual ou não, proveitosa ou não. No caso de troca, porém, trata-se sempre de uma coisa positiva, ao menos em princípio. Trocar é desde logo entender-se com alguém, compreender seu ponto de vista, colocar-se em seu lugar, mas não apenas. É também estar a par das razões pelas quais alguém faz o que faz, pensa o que pensa e diz o que diz. Didatizando ainda mais, é começar uma amizade. Na nomenclatura mercantil/militar de hoje, em que concluir uma tarefa é “entrega”, malhar é “treinar”, pensar na vida é “reconfigurar o mindset” e praticar é “aprimorar competências”, naturalmente a conversa passa à condição de troca. Mas o que se troca na troca de fato? Que produto ou substância, que valores e capitais se intercambiam quando duas ou mais pessoas se põem nessa condição de portadores de algo que se transmite? Fiquei pensando nisso mais te...
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