Lembro quando ainda criança, no meio
da aula me perdia e só voltava a custo, às vezes porque a professora chamava
pelo nome, às vezes porque tocava o sino do recreio e todas as crianças saíam
em galope desenfreado. Muito tempo depois, já adulto e ainda desligado,
passaria a me referir a esses momentos como suspensão. Porque eram de fato
isso: um hiato no meio da rotina, um pequeno abismo gestado sob os pés por
força não da imaginação voluntária. Os abismos que criava eram de outra
natureza.
Tenho ouvido cada vez mais “troca” como sinônimo de diálogo, ou seja, o ato de ter com um interlocutor qualquer fluxo de conversa, amistosa ou não, casual ou não, proveitosa ou não. No caso de troca, porém, trata-se sempre de uma coisa positiva, ao menos em princípio. Trocar é desde logo entender-se com alguém, compreender seu ponto de vista, colocar-se em seu lugar, mas não apenas. É também estar a par das razões pelas quais alguém faz o que faz, pensa o que pensa e diz o que diz. Didatizando ainda mais, é começar uma amizade. Na nomenclatura mercantil/militar de hoje, em que concluir uma tarefa é “entrega”, malhar é “treinar”, pensar na vida é “reconfigurar o mindset” e praticar é “aprimorar competências”, naturalmente a conversa passa à condição de troca. Mas o que se troca na troca de fato? Que produto ou substância, que valores e capitais se intercambiam quando duas ou mais pessoas se põem nessa condição de portadores de algo que se transmite? Fiquei pensando nisso mais te...