Lembro quando ainda criança, no meio
da aula me perdia e só voltava a custo, às vezes porque a professora chamava
pelo nome, às vezes porque tocava o sino do recreio e todas as crianças saíam
em galope desenfreado. Muito tempo depois, já adulto e ainda desligado,
passaria a me referir a esses momentos como suspensão. Porque eram de fato
isso: um hiato no meio da rotina, um pequeno abismo gestado sob os pés por
força não da imaginação voluntária. Os abismos que criava eram de outra
natureza.
Numa dessas andanças pelo shopping, o anúncio saltou da fachada da loja: “museu da selfie”. As palavras destacadas nessa luminescência característica das redes, os tipos simulando uma caligrafia declinada, quase pessoal e amorosa, resultado da combinação do familiar e do estranho, um híbrido de carta e mensagem eletrônica. “Museu da selfie”, repeti mentalmente enquanto considerava pagar 20 reais por um saco de pipoca do qual já havia desistido, mas cuja imagem retornava sempre em ondas de apelo olfativo e sonoro, a repetição do gesto como parte indissociável da experiência de estar numa sala de cinema. Um museu, por natureza, alimenta-se de matéria narrativa, ou seja, trata-se de espaço instaurado a fim de que se remonte o fio da história, estabelecendo-se entre suas peças algum nexo, seja ele causal ou não. É, por assim dizer, um ato de significação que se estende a tudo que ele contém. Daí que se fale de um museu da seca, um museu do amanhã, um museu do mar, um museu da língua e por