Sim, de algum modo, é possível imaginar que haja uma segunda voz para cada coisa dita, e uma terceira para cada coisa apenas esboçada, mas não dita, o tipo da coisa que fica presa por anos e anos, à espera não que seja finalmente verbalizada, posta goela e língua e dentes afora, mas que os dias e depois os anos e por obra do tempo arredio as décadas enterrem-na bem fundo, essa coisa de que não gostaríamos de abrir mão, reconheçamo-lo, todavia, seja porque há todo um clichê de frases cuja validade é unicamente enfatizar a grandeza das perdas, seja porque, de uma maneira ou de outra, elas nos sobrevêm, não custa nada entender que nem tudo é feito para virar palavra.
Dito isso, é possível, sim.
Tenho ouvido cada vez mais “troca” como sinônimo de diálogo, ou seja, o ato de ter com um interlocutor qualquer fluxo de conversa, amistosa ou não, casual ou não, proveitosa ou não. No caso de troca, porém, trata-se sempre de uma coisa positiva, ao menos em princípio. Trocar é desde logo entender-se com alguém, compreender seu ponto de vista, colocar-se em seu lugar, mas não apenas. É também estar a par das razões pelas quais alguém faz o que faz, pensa o que pensa e diz o que diz. Didatizando ainda mais, é começar uma amizade. Na nomenclatura mercantil/militar de hoje, em que concluir uma tarefa é “entrega”, malhar é “treinar”, pensar na vida é “reconfigurar o mindset” e praticar é “aprimorar competências”, naturalmente a conversa passa à condição de troca. Mas o que se troca na troca de fato? Que produto ou substância, que valores e capitais se intercambiam quando duas ou mais pessoas se põem nessa condição de portadores de algo que se transmite? Fiquei pensando nisso mais te...
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